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1 Fevereiro 2016 às 17:59

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DIRETIVAS ANTECIPADAS DE VONTADE – Testamento Vital (conclusão)


Publicado dia 1/02/2020 às 05:59


AUTORA: Lurdes Dias Alves

6. Procuração de cuidados de saúde
A Lei 25/2012 de 16 de Julho regula igualmente a nomeação de procurador de cuidados de saúde, nos seguintes termos:
a) A procuração de cuidados de saúde é o documento pelo qual se atribui a uma pessoa, voluntariamente e de forma gratuita, poderes representativos em matéria de cuidados de saúde, para que aquela os exerça no caso do outorgante se encontrar incapaz de expressar de forma pessoal e autónoma a sua vontade; Aplicando-se com as necessárias adaptações, o disposto nos artºs 262º e 264º, bem como nos nºs 1 e 2 do artº 265º, todos do Código Civil.
b) Qualquer pessoa pode nomear um procurador de cuidados de saúde, bem como um segundo procurador, caso o primeiro se encontre em situação de impedimento, atribuindo-lhe poderes representativos para decidir sobre os cuidados de saúde a receber, ou a não receber, pelo outorgante, quando este se encontre incapaz de expressar a sua vontade pessoal e autonomamente;
Não podem ser nomeados procuradores de cuidados de saúde, os funcionários do Registo Nacional do Testamento Vital (RENTEV) e os do Cartório Notarial que intervenham nos atos regulados pela Lei 25/2012, bem como os proprietários e os gestores de entidades que administram ou prestam cuidados de saúde.
c) As decisões tomadas pelo procurador de cuidados de saúde, dentro dos limites dos poderes representativos que lhe competem, devem ser respeitadas pelos profissionais que prestam cuidados de saúde ao outorgante;
d) Em caso de conflito entre as disposições formuladas no documento de diretivas antecipadas de vontade e a vontade do procurador de cuidados de saúde, prevalece a vontade do outorgante expressa naquele documento;
e) A procuração de cuidados de saúde é livremente revogável pelo seu outorgante, encontrando-se também prevista a possibilidade do procurador renunciar à procuração, devendo, neste caso, deverá informar por escrito o outorgante.
7. Registo do testamento vital e da procuração de cuidados de saúde
O RENTEV (Registo Nacional de Testamento Vital) manterá atualizada a informação relativa às DAV e procurações de cuidados de saúde registadas, referentes a cidadãos nacionais ou estrangeiros.
O registo não é condição de validade dos referidos documentos, mas pretende garantir o seu conhecimento por quem possa neles ter interesse, nomeadamente pelos prestadores de cuidados médicos.
O registo das DAV ou da procuração de cuidados de saúde é feito presencialmente pelo outorgante ou solicitado através de correio registado com aviso de receção, e mediante o preenchimento do modelo aprovado pela Portaria, assinado pelo declarante e com a assinatura reconhecida presencialmente.
O pedido presencial de registo deve ser apresentado junto dos serviços de cuidados de prestação de serviços de saúde da respetiva área da residência do interessado.
Os documentos apresentados serão depois validados pelo Agrupamento de Centros de Saúde ou Unidade Local de Saúde, podendo o interessado ser notificado para proceder à retificação ou junção de documentos adicionais (em 10 dias úteis), se necessário. Não sendo supridas as deficiências encontradas, o processo de registo caduca.
Sendo o registo concluído com sucesso, é disso dado conhecimento ao outorgante e ao seu procurador, no caso de o documento a registar ser uma procuração.
Quando seja necessária a prestação de cuidados de saúde a pessoas incapazes de expressar de forma livre e autónoma a sua vontade, o médico verifica a existência de documentos de DAV ou procuração de cuidados de saúde registados no RENTEV, dando cumprimento ao que delas constar, no caso de existirem.
Os profissionais de saúde podem não cumprir as diretivas se justificarem com objeção de consciência16, mas o estabelecimento de saúde tem que garantir o seu cumprimento.
O outorgante, o seu procurador ou as entidades médicas podem consultar a referida base de dados através do Portal do Utente. Todos quantos acedam a estas informações estão vinculados a dever de sigilo.
Os documentos submetidos e a vontade expressada podem a todo o tempo ser alterados, sendo válidos pelo período de 5 anos. Com uma antecedência mínima de 60 dias, a entidade junto da qual o registo está feito deve avisar da caducidade eminente, para que, havendo nisso interesse, possa o outorgante renovar os documentos, mediante a apresentação de uma declaração de confirmação.
Cada acesso à informação do RENTEV é automaticamente notificado ao outorgante ou ao seu procurador, desde que estejam registados os respetivos endereços de correio eletrónico.
8. Breves notas conclusivas
Um dos direitos enunciados na Carta dos direitos e deveres dos doentes é precisamente o Direito à livre escolha dos prestadores de cuidados de saúde, a Constituição da República Portuguesa consagra no nº 4 do artº 64º que o serviço nacional de saúde tem gestão descentralizada e participada.
Ora, o que assistimos nos últimos anos ou década e que existe um retrocesso na descentralização, muitas têm sido as notícias que nos chegam pelos media de partos em ambulâncias; de partos de crianças portuguesas nascidas em maternidades espanholas (sobretudo nas zonas fronteiriças) em virtude da menor distância; partos ocorridos a bordo de aviões da força aérea Portuguesa (o caso das parturientes que têm de viajar nos Açores de Santa Maria para São Miguel); de idosos (de aldeias sobretudo do interior do país) que residem a vários quilómetros do centro de saúde mais próximo, situação agravada pela escassez de transportes públicos, em que muitas vezes só até ao transporte mais próximo deparam-se com uma distância de caminhada que a sua condição física já não permite; de situações de emergência, em que o atraso na prestação de cuidados urgentes e até mesmo de suporte básico de vida, põe em causa a vida do doente.
2Perante estas adversidades, não pode a sociedade exigir destes o dever de zelar pela sua própria saúde, porquanto não têm a menor possibilidade de exercer tal dever.
Uma outra questão consiste na aceitação por parte do doente – da doença, que por razões religiosas, aceita o sofrimento que Deus lhe deu. Esta aceitação, esta crença, provém sobretudo da sua liberdade de consciência, da sua espiritualidade em que a capacidade de suportar o sofrimento é encarado como o alcançar da sua própria redenção.
Do mesmo modo que, de acordo com o direito à liberdade religiosa, não pode ser censurável, nem tão pouco contrariada, a decisão de uma Testemunha de Jeová em não realizar uma transfusão sanguínea, porque esta decisão tomada no âmbito da sua liberdade de consciência, lhe confere a faculdade de escolher os seus próprios padrões de ponderação ética ou moral.
Certo é que, no exercício da sua liberdade religiosa e no respeito da sua dignidade de pessoa humana, os poderes públicos e as entidades privadas não podem interferir nessa decisão, devem antes, respeitar essa decisão, desde que a mesma se mostre informada e livre.
Porque uma Testemunha de Jeová tal como uma qualquer outra pessoa que confesse uma qualquer religião é livre de crer ou não, na divindade, no sobrenatural, no transcendente, nos princípios básicos de uma determinada religião, por optar ou não, numa visão mais ou menos compreensiva do mundo. Porque o que realmente interessa à pessoa é que a sua convicção responda às questões últimas sobre o sentido da vida, da sua própria vida.
Nesta sociedade plural que embrenha as suas raízes numa visão humanista das relações humanas e interpessoais, e proclama o respeito pelos direitos humanos como “bandeira” imprescindível à dignidade humana. Sociedade esta em que a morte é “tabu”, porque valoriza a beleza, a saúde perfeita e a juventude, terá inevitavelmente de aceitar a degradação, a dor (associada à doença e à idade) e por fim – a morte.
Porque, cada um de nós deverá ter a possibilidade de viver a sua própria morte como uma fase da vida, logo, ter a autonomia para efetuar escolhas com a finalidade de ter uma morte digna – uma boa morte.

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